segunda-feira, 31 de outubro de 2011

MUTAÇÃO & CRESCIMENTO

não basta a troca 
celular intrínseca
sábia transmutação

experiências absorvidas
licões cotidianas
impressões vividas

metamorfoses ebulição
física mas insuficiente
alheia a mente permanece

inflexível emburrece
não assimila
acomodada desatinada

certezas empoeiradas
enraízadas dogmáticas
voos em asas atrofiadas... 



06/04/2009

domingo, 30 de outubro de 2011

MUNDOS PARALELOS

volto ao encontro
de mim mesmo
em devaneios
soltos, livres, tristes

como se não me achasse
nos dias que correm
na vida que se apresenta
ausente, distante de mim

impressão estranha
a que me incomoda
fazendo me absorto
em pensamentos tolos

necessitado de uma âncora
a me reter na realidade
contendo as asas tresloucadas
da doidivanas imaginação...







05/03/2011

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

SILÊNCIO QUE FALA

Palavras mal ditas
No ar espalham
Ofensas sentidas
Lágrimas que orvalham


Por vezes o calar
Sufoca o impropério
Responde sem penar
Dispensa o despautério


De mãos abertas
Coração desapegado
No silêncio o legado


Silenciar, sem recuar,
Bendizer, sem dizer,
Revidar, sem atacar...


* Selecionado para participar da 84° Antologia de Poetas Brasileiros Contemporâneos, editora CBJE, Rio de Janeiro/RJ   Distinguido entre os autores com mais de 100 mil leituras nas antologias on line da editora.

sábado, 15 de outubro de 2011

MESTRE SILVEIRA

(aos mestres no seu dia)


Nunca lhe soube o nome
conhecido como Silveira
nos seus módicos gestos

vinha com a sua valise
desdobrava cuidadoso
brancos o giz e avental

sua aula magia
sintaxes ditados
verbos sinônimos

mas fascinavam
redação e temas
alheio desperto

o mestre a leitura
a mente em giros
comprazia atento

deusas e viagens
livre imaginação
eu me entretinha

analisava avaliava
incremento fecundo
incentivos animava

a atenção bem me fazia
as frases mal redigidas
benevolente leitor relia

valorizava cada cena
motivações vaidades
os detalhes enaltecia

e sempre e por muito tempo
acabado o texto era para ele
aguardava os crivos sinceros

soube um dia
o pulmão vencido
o câncer o levaria

ainda hoje paternal
falta faz o professor
encorajadoras lições...

09/07/2008


(reminiscências do antigo ginásio estadual Macedo Soares, Barra Funda, São Paulo/SP, nos idos de 1971 a 1975)

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

ALQUIMIA


ALQUIMIA

benditos humanos,
das dores em deleites
do limão azedo,
a limonada


dos suores dos dias
alegrias, euforias
ritmadas em toadas
sofridas, amargas


do fel das coisas
o mel da vida
do pouco muito
do nada sonhos


risonhos, confiantes,
tementes às crenças
serenos, complacentes,
candidatos ao paraíso


sorrisos e cantos
disfarces de prantos
abnegados persistentes
renitentes nos enganos... 


*selecionada para figurar na 74° Antologia Brasileira de Poetas Contemporâneos, editora CBJE, Rio de Janeiro/RJ, edição Março/2011

Selecionado para figurar na edição especial Panorama Literário Brasileiro 2011, editora CBJE, lançamento novembro/2011.   Distinguido entre os autores com mais de 100 mil leituras nas antologias on line da editora.

A DOR DA AUSÊNCIA ( CONTO)


Antes tê-lo nas desavenças, ao silêncio representado na despedida.   Vítima de paradoxos emocionais, a ida definitiva deixava um vazio intolerável. Sua presença , na ausência, doía mais. Muito além que as contrariedades das pequenas 
questões, do opinar contrariado, de humores estragados, preenchia os espaços, apesar de tudo. Na distância, a dor presente, da presença imaginada, lembrado, impregnado nas paredes, gestos e passos, nítidos, percebidos, poeira dos tempos, momentos passados... Parecendo existir na ausência, como presença invisível, percebida sem ver. Ressentida e doída, na procura vã a lembrada imagem dele distante.

Laura andou pela casa, evasiva, melancólica, afinal, desligara-se dele, definitivamente. Era só questão de tempo, de purgar a memória, de acostumar-se distante, reconstruir os passos, curtir a liberdade tantas vezes anelada, supliciada pela vida a dois.
Não fora como pretendia, mas estava livre. Já não teria o fel a ser sorvido a dois, na solidão conjunta, Seres em mundos paralelos, sem retas convergentes.

O estado civil alterava, nada mais a retinha a ele, oras, por que sofrer ? Tantas vezes desejaram-se ver pelas costas, o que talvez faltasse a ambos era a coragem de sepultarem o insepulto cadáver da relação. Tudo resolvera de forma automática, sem litígios, nem advogados de lado a lado, dividindo os  bens materiais amealhados.
Como explicar a si mesma aquela sensação de vazio, de sentir-se inteiramente só, embora sempre se achasse independente, quando estavam juntos ?

Seria a falta que ele estranhamente representava, ou o medo do novo que se apresentava em sua vida ?  Questionamentos que não sentia-se capaz de concatenar, racionalizá-los naqueles momentos. Apenas a apatia, o estresse de se sentir desvinculada dele.

Correntes que aprisionam os Seres, dores acostumadas a serem sorvidas entre quatro paredes, sendo a liberdade uma quimera perseguida, quase uma esperança alimentando os dias e justificando as desditas. Algo que se anseia como objetivo, sendo razões para justificativas, nada mais que isso.

Por vezes o queria como um bibelô e mimo, disponível, apreciável a  alimentar a convivência, como algo aprazível, desfrutável... As dores do outro, ironicamente eram sabores seus. Nada como tê-lo para achincalhá-lo, o recriminando sempre em suas observações tenazes e irônicas. Cadeias geradas no imaginário das inseguranças, onde o outro torna-se apenas o reflexo das próprias angústias nutridas pela mente dominadora, sendo as vacilações  e dúvidas deste, as certezas do domínio, da submissão e da posse. Como se das fraquezas alimentasse as falsas convicções de poder sobre o parceiro. As luzes do outro, trevas e temores do dominador.

 Agora, sem ele, sentia-se solta, sem ecos aos reclamos, sem submissão ou consolos. Via-se nua com as suas fragilidades psicológicas, ou falsas verdades. Sim, pois recriminá-lo pelas pequenas faltas a assegurava em suas supostas certezas como  a dona da verdade. Naquele jogo neurótico, quem libertava-se de quem ?

A quem direcionar o seu domínio, impor o seu poder ? Laura angustiava-se. A  pretendida liberdade era apenas, sempre, uma pretensão, uma justificativa, uma falsa razão construída para si mesma. No íntimo, o queria refém, sob controle de si, de sua impositiva autoridade. Aquilo a fazia forte. Sem ele, sua muleta, sentia-se perdida, estranhamente fraca, sem rumo. Por razões oblíquas de lógica, o submisso, em sua situação, submete aquele que o submete, talvez fosse isso. Rompida a corrente da dominação, o dominador perdia sua referência.

Ele estava distante, inacessível aos seus domínios, enfim, livre, aquilo a incomodava, a quem dizer o quê, ministrando regras, fazendo-se senhora da situação ? Ou mesmo tendo a contrariedade de suas ordens, o que alimentava, de certa forma, aquela confusa relação a dois.

Dele restava o silêncio, apenas a presença pressentida, evocada na memória da parceira que se ressentia de sua ausência, para reafirmar-se em suas inseguranças, nutrindo suas falsas certezas, impondo-se.

Com o tempo, amoldaram-se como partes de um mesmo todo, em dialéticas oposições, dando cada qual sentido ao outro. Sem ele, a bússola estava biruta, sem eixo e nexo. Ninguém poderia perscrutar o que lhe ia em seu íntimo conflituoso, a reclamar a ausência do parceiro como se sentisse a falta de um leme em barco à deriva nos questionamentos. Quem a visse, consternava em piedade, vendo sofrer a morte de alguém querido. 

Eis que o pranto emudecido, jaz onde a dor impera, soberba, inteira, encobrindo a luz, amargando espinhos, no ambiente daquela câmara mortuária. A ausência presente, dolorida e desvairada, sem lenitivos, inconsolada. Em lágrimas onde a beleza fenece, pranteando saudades

Enquanto o corpo jazia inerte, venerado, velado, as lágrimas derramadas, ela tinha cúmplices nas dores da perda, no luto e na solidariedade, as mágoas amenizadas. Quando tudo se consumou, despedidas, condolências, ficando solitária em sua rotina, sem ecos aos seus argumentos, a voz monocórdia do interlocutor cessada, nenhuma diferença polemizada, apenas o palco vazio num monólogo enervante.

A inesperada e falsamente ansiada liberdade, rompendo laços, a fazia inteiramente presa e inconsolável, obsediando o falecido, como ambos se fizeram na carne, no dia a dia de suas convivências.

Restaria o consolo do tempo, consumindo, esmaecendo a figura marcante, dissolvendo, sumindo, buscando novos rumos e objetivos, reaprendendo a conviver, esquecendo...


*TEXTO SELECIONADO PARA FIGURAR NA ANTOLOGIA LIVRO DE OURO DO CONTO BRASILEIRO, EDITORA CBJE, RIO DE JANEIRO/RJ, EDIÇÃO JUNHO/2011 / SELECIONADO PARA FIGURAR NA EDIÇÃO ESPECIAL DO PANORAMA LITERÁRIO BRASILEIRO, ENTRE OS MELHORES CONTOS DE 2011 DA CBJE.